Nova Cosip pode alavancar cidades inteligentes no país
A Cosip, que ajudou a revolucionar o parque de iluminação pública do país, agora se apresenta como fonte para outra fronteira, a da informação.
Desempenho em 2023
A arrecadação com Cosip cresceu, em termos reais, 4% em 2023, um desempenho em linha com o obtido pela contribuição nos anos mais recentes, como mostrado nas edições anteriores de Multi Cidades (veja aqui). Com o avanço, a receita global da Cosip chegou a R$ 14,27 bilhões, superando a do ano anterior em R$ 543 milhões, em valores já corrigidos pelo IPCA médio de 2023.
Desde a conclusão da entrega da gestão do parque de iluminação pública para os municípios em 2014, foram observados dois momentos distintos do desempenho do recolhimento da Cosip. O primeiro deles compreende os anos seguintes à transferência do sistema, período em que a taxa de crescimento da contribuição era mais robusta, influenciada principalmente pela adesão paulatina de novos municípios. Esse fenômeno, que vai até o exercício de 2019, pode ser visualizado no gráfico anterior. No segundo momento, entre 2020 e 2023, nota-se que esse processo foi interrompido, e a expansão da captação da Cosip passou a ser moderada.
Essa mudança está assentada em diversos fatores que se fizeram sentir em períodos diferentes em cada cidade, mas, em suma, revela um fenômeno quase unânime: a dificuldade em alocar os recursos oriundos da contribuição vinha funcionando como obstáculo para um incremento mais forte da arrecadação.
Desde o recebimento do parque de iluminação, os municípios assumiram dois desafios. O primeiro foi levar iluminação às áreas que até então estavam desassistidas – contando, inclusive, com a resistência de alguns tribunais de contas, que vedavam o uso da Cosip para investimentos em expansão, uma vez que a Constituição Federal recepcionava que o instituto era apenas para o custeio, ou seja, para a manutenção do serviço já existente. O segundo desafio focava a melhora da qualidade do serviço, principalmente por meio da substituição das lâmpadas de vapor de sódio ou mercúrio por luminárias de LED.
As luminárias de LED, além de oferecerem mais conforto e agredirem menos o meio ambiente, reforçam a segurança pública, uma vez que amplificam a capacidade de iluminação dos logradouros públicos. Outras vantagens para a população estão associadas diretamente à economia, com a redução do consumo de energia em cerca de 60% e o maior tempo de vida útil, aliviando o custo com reposições.
Alcançados esses objetivos, constatou-se uma crescente economia de recursos, que se acumularam sem que as municipalidades pudessem utilizá-los em outras áreas. Ou seja, consolidada a expansão da iluminação para boa parte dos territórios antes desassistidos e concluída a modernização do parque, por que não estender o uso da receita de Cosip em funções correlatas, como a incorporação de tecnologias para a implementação de cidades inteligentes?
A Nova Cosip
Sensível a essa questão, a Frente Nacional de Prefeitas e Prefeitos (FNP) atuou ativamente, durante a tramitação da Reforma Tributária, para construir possibilidades de alterações na Constituição, a fim de tornar mais modernas as permissões de uso dos montantes originários da Cosip. Após intensa articulação com o Congresso Nacional, com o Governo Federal e com instituições interessadas no tema, foi promulgada a EC 132/2023 (Reforma Tributária), que incluiu e inaugurou novas possibilidades de destinação dos recursos da Cosip, por meio de uma alteração no artigo 149-A da Constituição. Agora, além de custearem todo o serviço de iluminação pública, suas receitas estão credenciadas a financiar a expansão e o aprimoramento de equipamentos e sistemas de monitoramento de vias e logradouros públicos.
Com essas modificações, não é exagero dizer que os municípios possuem agora um instrumento muito mais potente para melhorar a vida de seus cidadãos: uma Nova Cosip, com a pacificação de históricos entraves e a inserção, em boa hora, da possibilidade de se financiar com essa fonte equipamentos e sistemas que fortalecem a gestão pública, promovendo a integração de informações e tecnologias. Tal mudança permitirá que as cidades estejam mais bem preparadas para enfrentar os desafios urbanos deste século e entregar resultados mais eficazes em políticas públicas.
Potencial de arrecadação
Levantamento realizado na edição anterior de Multi Cidades (veja aqui) revelou que, em 2022, dos 5.084 municípios com dados consolidados até o fechamento da publicação, 1.109 não declaravam qualquer receita com a Cosip. O estudo indicou também que, até aquela data, a maioria esmagadora dos municípios que optava por não cobrar a contribuição tinha populações inferiores a 50 mil residentes. Dos 1.109, um total de 1.061 se enquadrava nesse recorte, o equivalente a 95,7% dos casos. Entre outras conclusões, o levantamento mostrou que a adesão desses municípios teria potencial arrecadatório de R$ 1,18 bilhão, a preços de 2023.
Após um ano, as cidades avançaram mais um pouco nesse sentido. Para o exercício de 2023, dos 5.297 municípios com dados disponíveis, 4.291 apontaram algum valor recolhido por meio da Cosip, enquanto 1.006 não tiveram receitas declaradas, o que revela uma proporção de 81% contra 19%. Para efeito de comparação, em 2022, a amostra informava que 78,2% dos municípios já haviam instituído a contribuição em seu território.
Somados, os 1.006 municípios que não cobraram a Cosip em 2023 apresentaram um potencial de recolhimento de R$ 1,31 bilhão para aquele ano. Desses municípios, 959, ou 95,3%, abrigavam populações inferiores a 50 mil habitantes, dos quais 551 eram localidades com menos de 10 mil habitantes.
Embora o volume global de recursos com potencial de arrecadação seja relevante, os incentivos para a adoção da Cosip nas cidades com menor porte populacional não são significativos. Isso porque a receita corrente média anual daquelas com menos de 10 mil habitantes e que cobram a contribuição foi de R$ 36,5 milhões, em 2023. O recolhimento médio com a Cosip desse conjunto foi de R$ 280 mil, o equivalente a apenas 0,8% da receita corrente. Portanto, a baixa representatividade da receita de Cosip diante da receita corrente seria um desestímulo à sua cobrança para aqueles que ainda não o fazem.
Com a Nova Cosip, esse cenário tende a mudar, uma vez que, além dos grandes centros urbanos, as cidades de menor porte populacional poderão se beneficiar com as inovações legais que permitirão a adoção de sistemas e equipamentos necessários para a constituição de cidades inteligentes.
A instalação de câmeras, sensores e alarmes, por exemplo, poderá contribuir com a segurança pública, a mitigação de desastres naturais e a coleta de dados essenciais para o monitoramento das condições ambientais em tempo real, tendo, inclusive, a possibilidade de financiar centros de operação e controle. O custo desses projetos, agora financiados por uma fonte estável de receitas como a Cosip, impulsionará essas realizações. Dessa forma, é possível dizer que, por meio da regulamentação desse tema, tratado no PLP 108/2024, com articulação da FNP, a Nova Cosip terá um papel mais relevante dentro do orçamento municipal, e sua arrecadação deverá crescer continuamente nos anos a seguir.
Destaques em 2023
Ao analisar o desempenho da Cosip de 2023 nos municípios agrupados por porte populacional, nota-se que o salto de 4% foi impulsionado por cidades de pequeno e médio porte, onde a população não supera 100 mil habitantes. Nessas localidades, a expansão média variou entre 8% e 10%, como pode ser visto no gráfico a seguir. Dos R$ 543,4 milhões adicionados, R$ 420,1 milhões, ou 77,3% do crescimento, tiveram origem nessas cidades, especialmente as do Norte e do Nordeste.A faixa que agrega os municípios com população entre 100 mil e 200 mil habitantes reportou um aumento de 5,4%, maior que a média nacional. Nesse grupo, a Cosip injetou R$ 91,7 milhões em recursos adicionais quando comparado ao exercício de 2022. Na faixa seguinte, que começa com municípios de 200 mil residentes e vai até meio milhão, a alta em relação ao ano anterior foi de 2,6%, com R$ 70,8 milhões alocados a mais.
Por outro lado, nos municípios que apresentam mais de meio milhão de moradores, a arrecadação da Cosip oscilou levemente para baixo, apurando uma variação de -0,8% e uma perda de receita de cerca de R$ 39 milhões.
Esse perfil do desempenho sintetiza muito bem o que foi explicado nas seções anteriores. Os municípios de grande porte populacional, em sua grande maioria, já haviam aderido à Cosip, o que limita a possibilidade de ganhos de receita pela adoção da contribuição por novas prefeituras. Ao mesmo tempo, os serviços prestados até então já contavam com uma fonte de recursos estável e suficiente, não havendo espaço para um incremento acentuado da arrecadação.
Os municípios de menor porte, entretanto, ainda contam com a oportunidade da entrada de novos participantes, como vimos ocorrer em 2023, o que contribuiu significativamente para um melhor desempenho da arrecadação do grupo. Aliado a isso, no interior do país, ainda há maior prevalência das lâmpadas de vapor de sódio e mercúrio. A troca desse material por luminárias de LED demandará recursos e, até lá, o consumo de energia continuará alto, forçando as municipalidades a instituírem a Cosip ou a elevar as receitas por meio dessa contribuição.
O recolhimento per capita por faixa populacional dos municípios confirma esse cenário: à medida que se eleva o porte, a receita por habitante da Cosip vai subindo. Enquanto a média nacional, em 2023, foi de R$ 71,28, nas 40 maiores cidades do país, onde a população é superior a 500 mil residentes, esse valor ficou em R$ 84,35. Porém, nas duas primeiras faixas, as que agregam os municípios de menor contingente, essa cifra é bem inferior, de R$ 42,95 e R$ 58,50, como mostra o gráfico final.